A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quinta-feira, Projeto de Lei para socorro ao esporte nacional durante a pandemia do coronavírus, com gasto autorizado de até R$ 1,6 bilhão. O texto propõe, entre outras medidas, o pagamento de auxílio emergencial de R$ 600 a atletas e outros profissionais de baixa renda envolvidos em atividades esportivas. O texto segue para votação no Senado Federal.
O Projeto de Lei nº 2824 vem recebendo grande apoio de atletas, ex-atletas, confederações e federações esportivas de todo o país. Nas últimas semanas, foram realizadas ações para pressionar o Congresso Nacional e o Governo Federal pela aprovação.
Além do auxílio emergencial – três parcelas iniciais, com prorrogação por mais duas -, o texto aprovado na Câmara prevê também medidas para ajudar a aliviar o caixa de entidades esportivas, com a renegociação de dívidas com a União, por exemplo. Há ainda contrapartidas, como a responsabilização de dirigentes em casos de crime de gestão, com possibilidade de tomada de bens particulares de possíveis envolvidos.
Outra medida prevista é a reabertura durante a pandemia dos prazos de inscrição no Profut – programa de refinanciamento de dívidas de clubes e entidades esportivas criado em 2015 pelo Governo Federal.
– Não olhamos apenas para o medalhista olímpico, para o campeão. A Câmara olhou para o esporte com mais profundidade, olhou para o maqueiro, o boleiro, o nutricionista, o professor de educação física e vários outros que vivem da prática esportiva – comemorou o idealizador do projeto, deputado Felipe Carreras (PSB/PE).
Esta é a segunda tentativa do Congresso de promover um auxílio específico ao esporte nesse período da pandemia. Em maio, o presidente Jair Bolsonaro vetou a expansão do auxílio emergencial de R$ 600 aos profissionais da área.
Deputado Alexandre Frota (PSDB/SP) foi o relator do PL 2824 na Câmara — Foto: Michel Jesus/Câmara dos Deputados
Votação quente
A votação começou em clima tenso. Ainda com resistência de alas do Governo Federal, o deputado Vitor Hugo (PSL/GO), líder do governo na Câmara, apresentou um requerimento pedindo a retirada do projeto da pauta.
– O deputado que colocar sua digital e disser sim para a retirada está dizendo que é contra o esporte. Mais uma vez, eu repito. O deputado que disser sim é contra o esporte no Brasil – argumentou em Plenário o deputado Carreras.
Presidente da Câmara, o deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ) fez questão de ser o responsável por orientar a bancada do partido a manter o projeto na pauta. O próprio PSL, na voz do deputado governista Luiz Lima (PSL/RJ), também acabou pedindo para seguir a votação nesta quinta
Apesar do apoio de alguns partidos do chamado “Centrão”, como PP e PL, o requerimento foi derrotado: 278 x 143 votos.
Após a derrota inicial, a base governista cedeu e, em seguida, foi favorável ao texto apresentado pelo relator do projeto, deputado Alexandre Frota (PSDB/SP). No entanto, ressaltou que ainda lutará no Congresso por alterações no PL.
– O Governo entendeu a necessidade. Mas, como Governo, entende que precisam de ajustes. Somos solidários e vamos tentar aperfeiçoar o projeto. Vamos trabalhar – afirmou em discurso o deputado Coronel Armando (PSL/SC), um dos vice-líderes do Governo na Câmara.
Há duas semanas os deputados vinham tentando votar o PL 2824. O texto chegou a ser pautado três vezes sem sucesso por conta das movimentações da base governista entre os parlamentares.
Deputado Felipe Carreras (PSB/PE) é o idealizador do projeto de socorro ao esporte que tramita no Congresso Nacional — Foto: Najara Araujo/Câmara dos Deputados
Queda de braço com o Governo
O texto aprovado nesta quinta-feira é bem diferente do projeto original, apresentado no fim de maio pelo deputado Felipe Carreras, em conjunto com outros 13 parlamentares. Designado relator da proposta na Câmara, o deputado Alexandre Frota apresentou um texto substitutivo. De acordo com o deputado, construído por meio de de diálogo com atletas e entidades esportivas.
Na elaboração do substitutivo, Frota, Carreras e outros parlamentares favoráveis ao projeto travaram queda de braço com o Governo Federal. O Ministério da Economia questionou o impacto que o PL teria no orçamento e vinha tentando dificultar a tramitação na Câmara.
Segundo os cálculos do Ministério, as medidas originais previstas no PL 2824 trariam um impacto de até R$ 15 bilhões aos cofres públicos. Número questionado pelos parlamentares.
Após algumas alterações no texto, cálculos feitos por técnicos de orçamento e tributação da Câmara dos Deputados estimaram o impacto econômico em cerca de R$ 1,6 bilhão. Então, uma das soluções encontradas para facilitar o andamento do PL na Câmara foi incluir no projeto um mecanismo que limita os gastos com as medidas de socorro ao esporte justamente em R$ 1,6 bilhão.
A reportagem do GloboEsporte.com entrou em contato com a assessoria do Ministério da Economia, que se limitou a informar por meio de nota que “não comenta projetos ainda em tramitação no Congresso Nacional”.
Reabertura do Profut
Um dos artigos do texto aprovado nesta quinta-feira reabre o prazo de adesão ao Profut – programa de refinanciamento de dívidas de clubes – durante a pandemia. Inclusive, entidades excluídas por algum motivo do programa poderiam tentar o retorno.
A ideia de reabrir o Profut estava no texto original do PL 2824. Com impacto na arrecadação do Governo Federal, o item chegou a ser derrubado após conversas com técnicos do Ministério da Economia. No entanto, voltou a ser incluído no projeto por meio de uma emenda acatada pelo relator.
Tramitação
Aprovado na Câmara dos Deputados, o PL segue para votação no Senado Federal. Caso o texto sofra alguma alteração significativa, o projeto retorna para mais uma votação na Câmara. Se os senadores aprovarem sem mudanças, segue diretamente para a sanção do presidente Jair Bolsonaro.
Ao receber o projeto para sanção, o presidente pode transformar o texto integral em Lei, vetar alguns trechos ou vetar por completo. Em caso de veto, o Congresso Nacional ainda pode derrubá-lo para manter o texto aprovado anteriormente pelos parlamentares.
Principais pontos do PL 2824
Confira as principais medidas de socorro ao esporte previstas no texto aprovado nesta quinta-feira na Câmara dos Deputados:
Atletas e profissionais do esporte
- Auxílio emergencial: R$ 600 por três meses (prorrogado por mais dois) para atletas, árbitros, nutricionistas, técnicos, professores de educação física e outros profissionais ligados ao esporte. Mulher provedora de família monoparental (mãe solteira) pode receber até duas cotas (R$ 1.200). Para ter direito ao benefício, é preciso, entre outras regras, comprovar renda individual de meio salário mínimo por mês ou renda familiar de até três salários mínimos por mês.
- Bolsa Atleta: resultados em competições de 2019 também serão levados em conta para inscrição e recebimento da bolsa durante o período em que durar a pandemia (exceção ao programa Atleta Pódio).
- Premiações: isenção de Imposto de Renda em premiações recebidas durante o período da pandemia (teto máximo de R$ 30 mil).
- Linhas de crédito: bancos públicos federais poderão abrir linhas de crédito facilitadas para compra de material esportivo e condições especiais para renegociação de débitos fiscais. Podem participar pessoas físicas, microempresas e empresas de pequeno porte ligadas ao esporte.
Entidades esportivas e projetos ligados ao esporte
- Loterias: entidades esportivas não ligadas ao futebol ficam liberadas para usar até 20% da receita oriunda das loterias para pagar dívidas fiscais ou administrativas (salários de funcionários e impostos, por exemplo).
- Refinanciamento de dívidas: o texto prevê a renegociação de dívidas tributárias ativas ou inativas das entidades com a União.
- Profut: reabre o prazo de inscrição no programa durante o período em que durar a pandemia.
- Prestação de contas: prorrogação de prazos para prestação de contas de projetos que receberam apoio da União.
- Lei de Incentivo ao Esporte: aumento da porcentagem de isenção tributária para patrocínios ou doações a projetos do setor esportivo (objetivo é aumentar a captação de recursos por meio da Lei de Incentivo ao Esporte).
- Plataformas digitais: recursos destinados a projetos desportivos em plataformas digitais devem ter prioridade durante a pandemia.
- Protocolos de saúde: treinos e competições de todas as modalidades só podem voltar durante a pandemia com autorização das entidades de saúde locais.
Governança de entidades esportivas
- Dirigentes esportivos ficam sujeitos a confisco pelo governo de bens particulares em caso de comprovação de crimes de gestão.
- Ampliação da representação de atletas na direção da política esportiva.
Recursos
- Medidas previstas no PL poderão gerar um custo máximo de R$ 1,6 bilhão aos cofres públicos.
- Valor deverá sair do fundo de R$ 34 bilhões previsto pela MP 943, que libera crédito extraordinário a empresas para o pagamento de folha salarial.