Os protestos violentos que se seguiram à explosão no Porto de Beirute irromperam como a resposta de libaneses à falta de resposta do governo diante da maior tragédia que se abateu sobre o país depois da sangrenta Guerra Civil. Mais de 30 países ofereceram ajuda ao Líbano — cerca de US$ 300 milhões (R$ 1,6 bilhão) — mas sob condições. A mesma desconfiança da população no governo recai sobre os doadores: a de que o dinheiro realmente chegará a seus destinatários.
Diante da falência do sistema estatal, líderes mundiais alertaram que a ajuda para reconstruir Beirute só será liberada quando as autoridades se comprometerem com reformas políticas e econômicas. Mas o governo está ruindo.
Dois ministros se demitiram no fim de semana. Se houver uma reação em cadeia, ou seja, sete dos 20 ministros fizerem o mesmo, o governo será obrigado a renunciar. No cargo desde outubro, o próprio primeiro-ministro Hassan Diab, admitiu como possibilidade real a convocação de eleições.
Outro ponto que fomenta a desconfiança dos líderes internacionais reunidos neste domingo e o rancor entre manifestantes é a transparência na apuração das causas do desastre. Os indícios apontam para a negligência. Uma investigação independente e estrangeira, proposta pelos doadores, foi rechaçada pelas autoridades libanesas como um ataque à soberania.
Desta vez, a tragédia está diretamente ligada ao insolvente aparato estatal e não a um fator externo, a um conflito armado ou a um desastre natural. O caldeirão da insatisfação popular começou a ferver em setembro passado, com a população imersa em cortes salariais, demissões, desabastecimento e apagões de eletricidade. Acabou levando à queda do governo de Saad Hariri.
Vieram a pandemia do novo coronavírus e a megaexplosão de 2.700 toneladas de nitrato de amônio. Parte da cidade está destruída e 300 mil pessoas sem teto. O caldeirão transbordou.
A ajuda internacional oferecida está longe de salvar o Líbano, uma vez que os custos da tragédia de Beirute são estimados em US$ 5 bilhões (R$ 27,2 bilhões). Ainda assim, será pulverizada em métodos corruptos que dominam o núcleo de um sistema inepto, controlado pelos mesmos grupos políticos. Por isso, a conferência de doadores exige reformas estruturais e transparência, que os manifestantes nas ruas traduzem por queda do governo.
FONTE: G1